requalificação da praça alfredo issa
3º prêmio no concurso internacional Reinventing Cities São Paulo, promovido pela Prefeitura Municipal de São Paulo e pela C40 Cities.
https://prefeitura.sp.gov.br/web/sp_urbanismo/w/328335
https://www.c40reinventingcities.org/en/professionals/winning-projects/filter-sao-paulo/
O Concurso Reinventing Cities em São Paulo, realizado em 2022, foi uma iniciativa internacional promovida pela C40 Cities, uma rede global de cidades comprometidas com o combate às mudanças climáticas. Esse concurso buscou selecionar projetos inovadores e sustentáveis para a revitalização de áreas urbanas de diferentes cidades do mundo, incluindo São Paulo.
Em São Paulo, o concurso focou em 04 áreas específicas da cidade, oferecendo oportunidades para que desenvolvedores urbanos, arquitetos e designers propusessem soluções que transformassem essas regiões em locais mais sustentáveis, inclusivos e resilientes.
plano de avenidas e o perímetro de irradiação
Para pensar a revitalização da praça Alfredo Issa, antes de tudo, se faz necessário revisitar o Plano de Avenidas e refletir sobre suas sucessivas revisões, que completaram, no momento desse concurso, 92 anos.
Apresentado por Preste Maia com o nome de “Plano de Avenidas para a Cidade de São Paulo”, e conhecido apenas como Plano de Avenidas, era originalmente um livro publicado pela editora Melhoramentos, no ano de 1930, no qual um engenheiro que ainda era funcionário da Secretaria de Obras e Viação da Prefeitura de São Paulo, e que em um futuro próximo seria seu prefeito, avança sobre um plano de ações necessárias para viabilizar não somente o centro da cidade, mas propor a forma do seu futuro e inevitável crescimento. Prestes Maia considerava que a estrutura urbana que São Paulo apresentava naquele momento era insuficiente para o número de paulistanos daquela época e, com certeza, não daria conta no caso da cidade continuasse crescendo daquela maneira frenética.
as arestas da avenida de irradiação
Prestes Maia, apoiado em reflexões históricas e teóricas, propôs que a cidade se organizasse através de um sistema radial perimetral, e apresentou suas ideias e conceitos em três capítulos distintos. “O Perímetro de Irradiação”, primeiro desses capítulos, traz à tona a proposta de um anel viário em torno do centro da cidade. Dessa forma, segundo sua teoria, o problema dos congestionamentos na região central estaria resolvido e, ao mesmo tempo, aconteceria a expansão do centro que envolveria seu perímetro e um sistema de avenidas e viadutos.
A implementação do modelo teórico sobre um sítio geológico complexo e de topografia ondulada levam a construção de um anel viário que enfrenta heroicamente o traçado da cidade herdada.
A 3ª. versão da Av. de Irradiação é a que se implanta. Esta versão, como é natural no processo de projeto, é a versão factível, sem deixar de ser radical e nem de perder a hipótese central, o conceito que motivou esta ação claramente inspirada no plano de Haussmann.
Esse enfrentamento com a realidade gera neste Anel Perimetral, ao menos 3 arestas, 3 cotovelos, e não coincidentemente são as áreas: 2 – Alfredo Issa, 3 – João Mendes e 4 – Clovis Bevilaqua.
São nestas áreas que a cidade ainda sente a necessidade da busca de um equilíbrio entre o fluxo veicular privado (que recebeu ajuste e reformas desde essa época), e a qualidade do espaço do pedestre.
Croquis sobre o Plano de Avenidas de Prestes Maia e suas arestas (1938).
história e evolução urbana
Sara Brasil (1930) o perímetro de intervenção serve como articulador dos fluxos de bondes, vindos da Estação Júlio Prestes e do fluxo direto vindo da Estação da Luz.
É como se esta área fosse um portal de acesso do Centro Novo em direção ao Centro Histórico. O Setor é dominado pela Rua da Conceição (atual Rua Casper Libero) e pela Rua Epitácio Pessoa (futura Av. Ipiranga), mas que tem por sua vez uma participação secundária.
Plano de Melhoramentos (1940) o perímetro ganha um desenho urbano que qualifica as bordas (atual espaço da praça Alfredo Issa). Este período fortalece ainda mais o eixo histórico, através do alargamento da Rua da Conceiçaõ (atual Rua Casper Libero) até praticamente o início do Viaduto Santa Ifigênia. A Rua Timbirás se conecta ao setor.
VASP Cruzeiro (1950) esta base cartográfica registra o gigantesco alargamento da Rua Epitácio Pessoa para transformar-se na atual Av. Ipiranga, e também o alargamento da atual Av. Senador Queiroz.
Isso consolida o Anel Perimetral e transforma radicalmente o setor. A construção do Edifício Montreal de Oscar Niemeyer marca a paisagem urbana da cidade, que já é metrópole. Niemeyer entende a importância da esquina e cria um marco urbano que simboliza essa transformação. O partido não escolhe lado, não há via mais importante do que a outra, uma vez que uma leva ao Centro Histórico e a outra ao Centro Novo e a Praça da República.
O Edifício Garagem (1970) de Permultter e Nassar, do ponto de vista da sua implantação, dialoga com inteligência com o edifício Montreal. A praça que integrava o edifício ao seu entorno dava ao local uma condição pública que até então não existia. As frequentes mudanças de uso fragilizaram demais a qualidade do espaço publico ao seu redor. Apostamos na reforma e retomada da atividade deste edifício, pois somente a sua vitalidade poderá recuperar o sentido e a utilidade do espaço ao seu redor.
GEOSAMPA (2022) os ajustes na geometria do Anel Perimetral favorecendo a fluidez dos modais veiculares deixam claras marcas: ilhas de trânsito, espaços residuais. Apesar disso, é somente neste último período se consolida a maior parte do hoje chamamos Praça Alfredo Issa.
síntese e estratégias
O Anel Perimetral, com a sua intensidade, invisibiliza a história e evolução urbana da cidade. Tratamos de reequilibrar este importante “nós” da Avenida de Irradiação.
O eixo histórico LUZ-SÃO BENTO precisa ser recuperado e revalorizado para pedestres e ciclistas. O acesso ao Centro histórico pelo Viaduto Santa Ifigênia passa pela Praça Alfredo Issa.
Estratégias urbanas como ações de regeneração urbana:
[1] Desenhar para aglutinar as ilhas de trânsito, para transforma-las em espaço público, reduzir a zero os espaços residuais;
[2] Redesenhar o espaço veicular através de uma revisão rigorosa da geometria do sistema viário e das dimensões faz faixas dentro dos parâmetros de mobilidade a serem alcançados;
[3] Gerar espaços urbanos para compartilhar em vez de disputar. A disputa gera conflitos, conflitos geram sinistros;
[4] Reduzir a velocidade média e aumentando a fluidez dos automóveis, ações que contribuem significativamente para a diminuição do número de sinistros. Congestionamentos e veículos em alta velocidade são situações agressivas e desqualificam o espaço urbano.
A proposta se apoia em estratégias simples e factíveis. São propositivamente contemporâneas, tecnicamente precisas, orçamentariamente viáveis, de boa durabilidade e de baixa manutenção.
mobilidade
O fluxo de veículos é responsável por mais de 60% das emissões de gases de efeito estufa e um dos maiores desafios que o município enfrenta para alcançar os objetivos do PlanClima SP. Para tanto, a mobilidade ativa é a prioridade das políticas públicas de São Paulo e é considerado elementar para o desenho do espaço público e viário da Praça Alfredo Issa.
Em relação à mobilidade a pé, responsável por cerca de um terço das viagens, a qualificação no que diz respeito a conforto, acessibilidade e segurança – viária e pública são prioritários, prevendo-se o devido dimensionamento e qualidade dos espaços construídos e elementos de apoio, como bancos, áreas de descanso, bebedouros, etc.
Já as viagens de bicicleta ainda representam a minoria entre os meios de transporte, sendo necessário aumentar seu peso na divisão modal através de uma infraestrutura qualificada, segura e integrada aos demais modais de transporte públicos coletivos.
O transporte por ônibus deve progressivamente oferecer maior qualidade para os passageiros e adotar energias mais limpas (continuar reduzindo CO2, NOx e material particulado), atraindo mais usuários que possam deixar de utilizar o transporte individual, por automóvel ou motocicleta.
Dessa maneira, considerou-se essencial manter e ampliar a prioridade das faixas exclusivas de ônibus das Avenidas Senador Queirós, Casper Líbero e Ipiranga, integrando-as a um novo ponto de ônibus junto a Praça Alfredo Issa, a fim de atender, principalmente, o intenso fluxo de usuários da E.T.E.C. Santa Ifigênia e Centro Paula Souza.
iluminação pública
Sendo a iluminação pública eficiente um requisito fundamental para a vitalidade dos espaços públicos no período noturno, o projeto vai ao encontro das diretrizes do Estatuto do Pedestre, indicando o reforço da luminância próximas às esquinas e travessias a fim de evitar sinistros.
Além disso, a proposta de ampliação da iluminação pública com novas luminárias e da substituição de lâmpadas de vapor por LED incorpora o Programa de Metas, priorizando regiões mais vulneráveis em relação à segurança pública.
A proposta busca estabelecer uma cobertura luminosa adequada e distribuída ao longo de toda área de intervenção, através de distintos tipos de iluminação, em alturas adequadas para pedestres, ciclistas e veículos, evitando áreas sombreadas, penumbras e conflitos com as árvores.
Além disso, a iluminação cênica, instalada em eixos de árvores, canteiros e jardins possibilitam a criação de atmosferas únicas para o uso noturno da cidade, promovendo destaque à paisagem e ao entorno urbano.
paisagismo
A arquitetura da paisagem é elementar para estabelecer a ideia de lugar e configurar uma identidade única ao espaço público. Propusemos uma série de escalas de aproximação do usuário com a paisagem, promovendo uma relação ativa com esses espaços.
Através de conceitos contemporâneos, priorizou-se espécies arbóreas nativas com florações marcantes e copas generosas, capazes de promover sombras e memórias afetivas com o espaço público. As espécies arbustivas, indicadas para canteiros, jardins e floreiras, são capazes de promover a captura CO2 da atmosfera e devolver O2, promovendo qualidade do ar, bem público-coletivo.
A infraestrutura verde, por meio de jardins de chuva com espécies fitorremediadoras, promovem a resiliência urbana diante de chuvas intensas, principalmente nessa área, devido à baixa profundidade do lençol freático.
mobiliário e materialidade
Os mobiliários propostos seguem os modelos indicados pelo projeto vencedor do Concurso Nacional de Mobiliário Urbano de São Paulo, desenvolvidos pelo Estúdio Módulo, e foram locados de maneira estratégica a fim de configurar ambientes qualificados para os cidadãos.
A materialidade proposta para os pisos e demais infra-estruturas, como pergolados e bancos, buscam selecionar materiais adequados ao espaço público, exigindo baixa manutenção e alta durabilidade ao longo do tempo.
Propõe-se para os espaços de pedestres um pavimento único, em concreto moldado-in loco, com diferentes texturas, monocromáticos em tonalidades de cinza, e desenhados por uma retícula regular que demarca e integra o território de intervenção.
O mobiliário e a materialidade, além de proporcionar acessibilidade universal, busca valorizar esteticamente as áreas públicas, que são a essência do espaço urbano.
ficha técnica:
projeto: Revitalização da Praça Alfredo Issa
local: Santa Ifigênia, São Paulo – SP
data: 11/2022
área de intervenção: 14.611,68m²
autores:
Mario Figueroa
Glória Cabral
Erick Vicente
Kelly Bozzato
colaboradores:
Daniel Maioli
Gustavo Bondezan
Camila Rocco
Daniel Picolotto
Mariana Gonzales
Kamila Do Rocio
Rafaela Miranda (imagens)
consultoras:
Maria Tereza Diniz (mobilidade)
Joyce Lopes da Silva (traçado viário)
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Data:
28/09/2025